Senhorões de província

Paula Rego, Mulher Cão

Senhoras de letras limpas, letras mortas, para além de tortas. Senhoras que cozem bordados de cor e forma de framboeza nas lides da casa que sempre ordenaram a outras, das barracas de Angola à costa goesa. Senhoras prendadas em lides dilectas, filhos rapazes, dos verdadeiros, daqueles que arranham os joelhos quando caiem das bicicletas, que ensinam preceitos enquanto receitam ordens, umas vezes senhoras, outras vezes explodem. Senhoras generosas nas esmolas todas, da tolerância das escolas a outras tantas fodas, oferecem panegíricos em florais arranjos, toleram diferentes como se fossem anjos, aceitam-lhes o brilho como se fosse de chita, quando os ouvem elogiados, até a alma apita. Então os pimpolhos, sem graça, boçais, a trabalharem connosco como se fossem iguais, não lhes chega o favor de lhes dar o aval, que a mãe ainda há dias tinha avental, vêm os de fora, que afronta, que insulto, com a conversa pronta a rondar o indulto, lêem-lhe os textos como se fossem obra, para mim mais não é que banha da cobra, não têm berço, nem preceito, nunca rezaram terço ou houveram proveito, e chovem-lhes assim palavras sentidas que só a nós deviam ser dirigidas, não pode ser, a democracia é gira mas não é para todos, se não temos mão nisto, escreverão a rodos, homossexuais, pretos, ciganos, putas migradas, construtores, e mais, as letras são nossas, senhoras da terra, do cá e do além, do mar como a mais ninguém, andámos nós tanto ano a escrever com desdém, e eles em anedotas, risos, palhaçadas, a escrever para dentro, quais almas fechadas, deitam fora tudo em riachos de nada, dão assim a vida por acabada, deitam-se sós, no lodo, não pode ser bom, deixa estar, logo te fodo, mas que não pode ser, não pode, isto que escrevo é que é uma ode!
Senhoras de outrora tardiamente canhotas, provincianas loucas de letras rotas, remendadas em figos, amêndoas e sorrisos, palhaças sois vós, seus espantalhos de sisos!